sexta-feira, fevereiro 03, 2006

(Crítica) Vai e Vem

Vai e Vem
de João César Monteiro

Quando entrei na sala da Cinemateca ia com algumas noções do que ia ver. A verdade é que, ao contrário do que gosto de fazer, ia com uma ideia pré-concebida do que era um filme de João César Monteiro.
Todos nos lembramos do teatro que foi feito à volta do seu filme Branca de Neve e como chocou a opinião pública fazer-se um filme com diálogos e o ecrã preto.
Como não vi o Branca de Neve, não posso tecer juizos sobre o mesmo. Contudo, Vai e Vem é uma experiência de resistência.

A personagem principal, João Vuvu, intepretada pelo próprio realizador, é um velhote solitário à procura de empregada doméstica. Tem uma vida pacata, grandemente preenchida pelo constante vai e vem no bairro onde habita. E que mais posso contar acerca da história deste filme? Pouco mais na verdade.
A narrativa do filme não se prende tanto com o contar de uma história mas sim de pequenas histórias, onde por acaso (ou não) a personagem principal é sempre a mesma. Existem inúmeras alegorias e metáforas no texto. Quase tantas como planos. E tendo como pano de fundo a sátira e/ou a crítica de costumes, temos cenas fabulosas. A religião, o estado, o fanatismo político, os Estados Unidos e a guerra do Iraque sofrem todos ataques subtis mas demolidores.
A par do conteúdo, temos uma realização fabulosa. Lisboa nunca foi filmada com a beleza que se apresenta aqui. Temos planos sublimes que nos levam a um Verão quente na cidade. Personagens que habitam o imaginário colectivo dos alfacinhas e, a meu ver, uma sublime homenagem a Lisboa. Ainda ao falar da realização, existe uma sensibilidade experimentalista no filme que muito me agradou. A câmara está grande parte das vezes parada, com planos a ocupar uma parede inteira de uma sala, quase como se fosse uma peça de teatro, ao invés de um filme. Existe uma exploração do fora de cena, visual e sonoro, que muito me agradou. Penso que teatral é mesmo o melhor adjectivo para atribuir ao estilo deste filme. Todas as cenas, são capítulos diferentes, e embora isso prejudique a continuidade, considero mais meritório que depreciativo.
Contudo, nem tudo no filme é bom. Tem três cansativas horas de duração. Outros duram o mesmo e não cansam metade. Tem um ritmo extremamente lento. A adiccionar a isto, temos uma história espartilhada, que nada abona a favor da concentração do espectador. E por fim, temos interpretações que não me convencem minimamente.
Não tendo conhecido João César Monteiro, parece-me que João Vuvu é apenas uma continuação do realizador, e tirando ainda o filho dele, o resto das personagens são desinteressantes, bidimensionais, e pura e simplesmente chatas. Não acrescentam nada, são meros acessórios, não peças integrantes.

No final, saí do filme com a sensação de que não entendi tudo. Sendo isto não muito bom, reside provavelmente na minha falta de capacidade de interpretação. Contudo, também saí sem vontade de rever o filme nos próximos tempos, o que considero falha do realizador. A verdade é que é uma experiência interessante. Mas que adultera um pouco o conceito de filme que tenho.

Vale a pena ver, mas com muita paciência.

7/10