sexta-feira, fevereiro 03, 2006

(Crítica) Suspicion

"Well, well. You're the first woman I've ever met who said yes when she meant yes."
Suspicion não é um dos filmes mais conhecidos da filmografia de Alfred Hitchcock e não é um filme deslumbrante. É um filme que tem um trunfo, um trunfo que o torna interessante. E esse trunfo é a maneira como está construído.
Começamos com o momento em que um galã (Cary Grant) conhece a filha de um general (Joan Fontaine) num comboio e acompanhamos o desenrolar de uma história romântica que gradualmente dá lugar a um thriller psicológico. A mestria, cujos créditos devem ser divididos entre realizador e argumentista, reside exactamente na forma como esta passagem é feita. Ao contrário de Red Eye (pegando num exemplo recente mas salvaguardando as devidas distâncias) onde a transição é feita de uma forma relativamente brusca, aqui a transição não podia ser feita de forma mais suave. Não é possível destacar um momento-chave, uma grande mudança - a história segue o seu curso e a suspeita cresce de forma natural e gradual no espectador. E eis que, no momento em que o desfecho se aproxima e a tensão está no pico, o espectador é brindado com um final abrupto e contra-corrente que atenua uma parte considerável do impacto que o filme tem. Curiosamente, segundo consta, o final planeado de início foi rejeitado pelo estúdio...
7/10
Nota: as linhas que se seguem contêm spoilers e, parte da informação que nelas consta, foi retirada de fórums online pelo que cada um é livre de lhes reconhecer a credibilidade que quiser.
Ao que parece, no final inicialmente previsto, Lina redigia uma carta em que denunciava o marido antes de morrer envenenada com o copo de leite, carta esta cujo conteúdo o marido desconhecia, acabando por a colocar no correio. O cameo de Hitchcock no filme - a pôr uma carta num correio - funcionaria como presságio e Johnny seria efectivamente culpado. De resto, note-se que segundo o testemunho do empregado francês, o responsável pela morte de Beakley era um tal "allbeam", sendo que Beakley chamava vulgarmente "old bean" a Johnny. Segundo se diz, o estúdio não estava preparado para apresentar um Cary Grant culpado ao grande público e exigiu outro final.
O que não percebo é, se o filme era suposto acabar com o copo de leite e foi imposto um happy ending, para quê filmar toda a sequência do carro? Adicionar emoção e ambiguidade? As vossas ideias são bem vindas...